terça-feira, 8 de setembro de 2009

Escrito no Navio

"Quando o céu começa a se iluminar com os clarões do poente, o camponês suspende
sua caminhada pela trilha, o pescador retém seu barco e o selvagem pisca o olho,
sentado perto de um fogo declinante. Recordar-se é uma grande volúpia para o
homem, mas não na medida em que a memória se mostra literal, porque poucos
aceitariam viver novamente as labutas e os sofrimentos que, no entanto, gostam
de rememorar. A recordação é a própria vida, mas com outra qualidade. Assim, é
quando o sol se abaixa sobre a superfície polida da água calma, tal como o óbolo
de um celestial avarento, ou quando seu disco recorta a crista das montanhas
como uma folha dura e denteada, que o homem encontra por excelência, numa curta
fantasmagoria, a revelação das forças opacas, dos vapores e das fulgurações
cujos obscuros conflitos, no fundo de si mesmo, e ao longo de todo o dia, ele
vagamente percebeu."




In Tristes Trópicos - Lévi-Strauss

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